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Empresa no ramo de saúde e mobilidade pretende quase dobrar de tamanho até 2030
Por Jéssica Paula
21 de junho de 2021
Se é verdade a máxima do empreendedorismo que diz que, para um negócio ter êxito, ele precisa nascer de uma dor, talvez seja possível compreender de onde vem o sucesso dessa família.
O irmão mais novo de Marcelo Soster, nosso entrevistado nessa edição, precisou alugar uma muleta. Pronto, estava aí uma necessidade clara. E nascia aí, sem que eles sequer ainda soubessem a dimensão, a Pé de Apoio, em 1995, na cidade de Porto Alegre.
A locação de muletas não era um sonho para a carreira de Marcelo, que se imaginava mesmo era jogando futebol. Mas com a ideia se saindo melhor do que a encomenda, não precisou mais do que 5 anos para que ele decidisse levar uma unidade dessa mesma loja para a cidade onde ele vivia na época, em Caxias do Sul.
A faculdade de adminstração cursada por Marcelo foi uma aliada. Mas a empresa ganhou ainda mais força quando o irmão do meio, decidiu mudar de carreira. Especialista na área financeira, coube ao novo sócio colocar as contas em ordem e impulsionar o sucesso dessa rede de lojas de materiais ortopédicos que hoje já conta com 27 unidades no país, concentradas nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul.

“Uma cadeira de rodas deve fazer uma pessoa voar, não prender ela”
— Marcelo Soster
Os irmãos e sócios da Pé de Apoio: Marcelo, Alexander e Ricardo Soster
O negócio
São incontáveis o número de vezes que Marcelo presenciou situações em que pessoas adquirem cadeiras de rodas, por exemplo, sem qualquer conforto e que não proporcionam que a pessoa com deficiência seja ativa. "Ou seja, aquele material acaba te limitando, e uma pessoa que pode voar, fica presa porque aquele modelo de cadeira de rodas prende ela", explicou.
"A gente está tentando mudar isso em loja. Precisamos nos colocar no lugar da pessoa. Um jovem que acaba adqurindo uma cadeira de rodas com encosto alto, com largura excessiva, pode se machucar e terá dificuldade de se mover com a cadeira. Nosso mercado (no Brasil) é muito amador ainda e temos muito a melhorar para atender e visualizar bem o que ele precisa."
Marcelo criticou o fato de existir, neste ramo, vendedores que apenas empurram produtos de quaisquer qualidade sem antes entender a necesside do cliente. "Se uma pessoa mora em uma casa apertada, você não pode vender uma cadeira com largura excessiva. Pergunte onde ele mora, a qualidade que ele quer, tudo isso faz parte da venda e, muita gente acaba não fazendo isso."
Mercado desafiador
Com intenção de estabelecer 50 lojas no país até o ano de 2030, a Pé de Apoio está focada no estado de São Paulo. A ideia é levar ao menos 20 novas unidades ao estado economicamente mais relevante do Brasil.
O cuidado com cada material vendido e a usabilidade de cada pessoa, também é um desafio. Marcelo cita como exemplo, o neoprene, que por vezes é colocado no mercado para suprir a necessidade de estabilizar ou para usar no dia a dia, mas que não é feito para isso, e sim para ser usado embaixo d'água.
Quem conhece de perto os desafios impostos pelas curvaturas acentuadas na coluna, sabe bem a dificuldade de encontrar um colete ortopédico que não seja desconfortável a ponto de machucar e deixar pequenas lesões no usuário, ou que prenda a pessoa a ponto de impedir que ela viva de maneira ativa.
"Você pega um colete nacional, é horrível de usar. Você pega um fabricado fora do país, ele é articulado no peito, no quadril para proporcionar que a pessoa se movimente, estabilize e consiga adesão ao tratamento. Mas infelizmente o preço as vezes não compensa."
Só nas lojas administradas por Marcelo há, em linha, mais de dois mil produtos. Ainda assim, a gama inteira de itens disponíveis no mercado ultrapassa o número de 20 mil. "Hoje, para se montar uma loja dessa ramo, completa, você vai precisar de 50 até 200 metros quadrados de espaço para ter espaço de demonstração desses produtos."
Por isso, o sócio explica que o investimento é alto para conseguir entrar nesse setor, já que o cliente precisa do produto a pronta entrega, e não pode esperar. "Precisamos trabalhar com um estoque alto porque o paciente precisa para ontem. Não posso deixar uma pessoa que teve uma lesão esperando uma cama para depois poder sair do hospital. Não dá pra esperar."

Mudanças com a pandemia
Além de materiais hospitalares, lojas do ramo da Pé de Apoio também investem em produtos para atividades físicas. Itens como cordas, colchonetes, halteres e anilhas podem ser usados como acessórios de musculação e atividades físicas em qualquer ambiente.
Por isso, entraram no radar daqueles que ficaram órfãos das academias durante o período de isolamento. Na terceira semana de março de 2020, quando as recomendações de isolamento foram intensificadas, a procura de alguns desses itens tiveram um aumento de 2.500% em
e-commerces do setor.
No caso da Pé de Apoio, a venda de equipamentos de proteção individuale ferramentas hospitalares lideraram as vendas desde o início da pandemia.
No entanto, o desafio dos valores devido às importações continuou. "O mundo inteiro precisando de máscaras e chegavam para nós o que sobrava do mundo a um preço enorme."
"Se é ruim para o movimento, é ruim para nós também. Muitas pessoas acham que, por sermos do ramo da saúde, não temos problemas com a crise. Temos problemas sim. A gente tentou manter as portas abertas, fizemos redução de horários", conta.
Por outro lado, uma vez que a rede de lojas já conta com uma estrutura que permite se planejar, a equipe conseguiu se adiantar e, ao perceber a dificuldade que o mundo enfrentava com a pandemia, garantiu estoque de alguns produtos antes que a Covid-19 de fato chegasse ao Brasil.
Confira no mapa abaixo todos os pontos de atendimento da empresa.

Diferencial
Mesmo com o período conturbado gerado pela pandemia, a empresa não deixou de fazer a demonstração presencial, um serviço especializado em que uma equipe da loja leva até o cliente que não pode sair de casa, as ferramentas que ele precisa adquirir para conferir de perto a qualidade do produto e testar, já que muitos desses itens, como muletas, cadeiras de rodas e andadores, são difíceis de comprar pela internet.
Família Soster e Salvador Renato Fagundes em inauguração de mais uma unidade da Pé de Apoio
Crescimento do Setor
Há cerca de 2500 lojas deste ramo no Brasil. No entanto, Marcelo defende que nosso mercado ainda é muito amador e tem um longo caminho a percorrer para que, de fato, consiga atender às mais diversas demandas do público.
Apesar do alto número, essas lojas estão concentradas nas mãos de poucos empresários.
O sócio da Pé de Apoio enxerga ainda que fatores como altas taxas para importação e o alto valor do dólar aliados a ausência de investimentos e tecnologias dentro do Brasil, dificultam a chegada de produtos com qualidade premium no país. "Há tecnologias que existem lá fora que se formos colocar em uma tornozeleira, por exemplo, o valor precisa aumentar em 150%. Esse mercado é muito grande e tem muita coisa para crescer."
Para conhecer e acessar as lojas da Pé de Apoio, clique aqui
Essa reportagem compõe uma série de entrevistas sobre empresas que contribuem para a autonomia e inclusão das pessoas com deficiência, fazendo com que todos possam viver o mundo.
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